Cansado de sempre responder à mesma pergunta “como assim, existe carnaval na Bolívia?”, decidi fazer um programa/post dedicado ao tema.
Não sei se por ignorância ou arrogância (também chamada de orgulho nacional), muitos brasileiros tendem a achar que o carnaval é uma festa unicamente celebrada no país do futebol (um esporte que também não surgiu no Brasil).
Na verdade, o carnaval trata-se de uma comemoração que remonta ao Império Romano. Com o passar dos séculos, ele mesclou tradições pagãs e cristãs para chegar até o que é hoje. Como resultado, quase todos os países ocidentais têm algum tipo de festividade nessa época do ano ou já tiveram algo parecido ao carnaval em algum momento da suas histórias. Isso significa: muito assunto e muita música para o Invasões Bárbaras.
Diabos, anjos, morenos e virgens
Se tantos países assim têm carnaval, por que falar especificamente da Bolívia? Em primeiro lugar, eu sou boliviano e tenho um conhecimento razoável sobre o assunto. Em segundo lugar, pelo fato de o carnaval desse país sul-americano ser reconhecido como uma das mais importantes festividades folclóricas do mundo.
Resultado de uma mistura das tradições europeias com rituais andinos, amazônicos e algumas pitadas de África, o carnaval ocorre em todo o território do país. Como este post já está um pouco longo, optamos por nos concentrar na festa mais tradicional e famosa do carnaval boliviano: o “desfile folclórico” da cidade de Oruro, situada a mais de 3700 metros sobre o nível do mar.
É uma celebração que soma a típica esbórnia do carnaval com culto à Virgem da Candelária – da tradição católica – e às divindades andinas (especialmente o deus uru Tiw, sincretizado na figura do diabo, também da tradição cristã).
Com o passar dos anos, Oruro foi recebendo grupos folclóricos de toda a Bolívia para desfilar em suas ruas. Atualmente mais de 20 danças compõem a festa, que desde 2001 é considerado pela UNESCO como Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade.
A seguir algumas amostras dessa diversidade:
Em “Morenada al Corazón”, o grupo Atajo mistura o rock com a morenada, uma dança que mistura origens negras e andinas, especialmente pela presença da matraca, um instrumento trazido do continente africano, e de máscaras que reproduzem feições com traços afro-bolivianos.
Gravado em 2008, este vídeo apresenta a diablada, a dança mais tradicional do carnaval orureño. Muitos antropólogos acreditam que as máscaras de diabos na verdade trazem, de forma implícita, representações de deuses andinos.